segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

POR QUE A SRª MERKEL ESTÁ TOTALMENTE ERRADA !


A doutrina Merkel parte do princípio que a crise resulta da irresponsabilidade dos governos e, assim, apenas uma regra “dura” sobre o orçamento pode evitar que estas crises voltem a acontecer.

Mas a análise de Merkel está totalmente errada. Não foram os défices excessivos que provocaram o colapso económico de 2007 e 2008 mas sim a excessiva concessão de créditos por parte do sector bancário. O aumento das dívidas públicas foram uma consequência da recessão económica e não a sua causa. O que deveria ter sido integrado na estrutura institucional da União Europeia era uma regulação financeira mais dura e não uma austeridade orçamental permanente. E tem havido poucos sinais no sentido de endurecer a regulação financeira.

Para já o mais importante é o falhanço da “união orçamental” na recuperação europeia. Os números são desanimadores: antes da cimeira, o Banco Central Europeu baixou a sua previsão de crescimento do PIB da Zona Euro em 2012 de 1,3% para 0,3%. Uma estimativa optimista. De facto, a Zona Euro vai contrair-se na primeira metade do ano – e provavelmente na segunda, devido às medidas de austeridade que estão a ser aplicadas – aumentado a pressão sobre os bancos e as dívidas soberanas.

A razão para a recuperação do crash de 2007 e 2009 ter sido tão anémica é simples. Quando uma economia diminuiu, a dívida pública aumenta automaticamente, porque as receitas caem e os gastos aumentam. Quando se cortam os gastos, a dívida cresce ainda mais, porque os cortes provocam uma nova contracção da economia. Assim aumenta, e não diminui, a probabilidade de um governo entrar em incumprimento.

Na Zona Euro, a maioria da dívida pública é detida por bancos privados. À medida que esta dívida aumenta, o valor dos activos dos bancos diminui. Ou seja, a crise da dívida soberana afecta os bancos. Ao submeter os governos debilitados a um racionamento férreo, como Merkel fez, tornou a crise financeira inevitável. Continuar a defender a salvação através da austeridade, à medida que a economia abranda e os bancos colapsam, é repetir o erro clássico do chanceler alemão Heinrich Brüning em 1930-1932.

Desde logo, a Zona Euro precisa mais do que um resgate. A periferia precisa de recuperar a competitividade e alguns ficaram animados com a redução dos défices comerciais dos países do Mediterrâneo – os desequilíbrios comerciais estruturais dentro da Zona Euro estão a corrigir-se, argumentam. Infelizmente, estas correcções não resultam de um aumento das exportações mas da queda das importações, consequências dos reduzidos níveis de actividade económica.

A ideia de que um país pode alcançar um excedente orçamental não importando nada é tão extravagante como a ideia de que um governo pode pagar a sua dívida sem receitas. O gasto de uma pessoa é o rendimento de outra. Ao insistir que os seus parceiros comerciais devem reduzir os gastos, Merkel está a cortar uma das suas principais fontes de crescimento.

Assim, conseguirá a moeda única sobreviver? Duas políticas, que em conjunto, podiam salvar o euro estão fora da agenda. A primeira é a emissão de moeda (flexibilização quantitativa) a uma escala heróica. O Banco Central Europeu deveria ter o poder de comprar o montante necessário de obrigações gregas, italianas, espanholas e portuguesas que permitisse baixar os juros da dívida destes países para o nível da alemã. Isto poderia estimular o crescimento real através de vários caminhos: reduzindo as taxas de juros dos empréstimos, aumentando o valor nominal dos activos públicos e privados e enfraquecendo o euro face ao dólar e outras moedas. 

Mas os efeitos de uma flexibilização quantitativa na actividade económica são incertos e, tal como uma política inflacionista, poderia provocar retaliações por parte dos parceiros comerciais da Europa.

É por isso que a flexibilização quantitativa deve ser aplicada em conjunto com um programa de investimento à escala da Zona Euro destinado a modernizar as antigas infra-estruturas do sul e do leste da Europa. Os gastos de capital dos governos, ao contrário dos gastos correntes, podem ser auto-financiados através dos utilizadores. Mas mesmo que não sejam, uma política de investimento bem escolhida produz retornos elevados: novas estradas reduzem os custos de transportes e novos hospitais geram uma força de trabalho mais saudável.

Já existe uma instituição, o Banco Europeu de Investimento, para aplicar este programa. Deveria ser recapitalizado numa escala que permitisse anular os efeitos contraccionistas do para dos programas nacionais de redução do défice.

A flexibilização quantitativa, em conjunto com o investimento público, poderia gerar o crescimento económico que a Zona Euro, urgentemente, necessita para reduzir, gradualmente, o peso da dívida. Mas é quase certo que nenhuma destas políticas, e muito menos as duas, vai ser implementada.


O Banco Central Europeu tem comprado, discretamente, obrigações no mercado secundário mas o novo governador, Mario Draghi, já garantiu que esta intervenção é temporária, limitada e visa apenas “repor o funcionamento dos canais de transmissão.



(Robert Skidelsky, membro da British House of Lords, professor honorário de Economia Política na Universidade de Warwick.
Fonte: Jornal de Negócios, em 22 de Dezembro )

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